terça-feira, 24 de maio de 2011

Na contramão da história

Indo na contramão da história, hoje vamos falar de Lech Kaczynski. Nunca ouviu falar dele? Aqui estamos para solucionar esse problema!

O nome desse cara era pra ser bem mais divulgado! Afinal, não é todo dia que você encontra um presidente católico praticante, honesto e autentico o suficiente pra se posicionar contra o comunismo numa Polônia de relações estreitas com a Rússia. Bem, como todo político honesto, Kaczynski morreu sob condições suspeitas (em um acidente aéreo). Tendo relações estreitas com o Vaticano (conservando inclusive uma amizade particular com João Paulo II), na ocasião de sua morte, no ano passado, o papa Bento XVI pronunciou imediatamente suas condolências à Polônia e à família. Saiba um pouco mais da história desse homem, das circunstancias de sua morte e das perseguições que sofreu por amor a Cristo e a Igreja.

Lech Kaczynski era um jurista profundamente católico, procedente do movimento anticomunista Solidaridade de Lech Walesa. Durante a instauração da lei marcial, em 13 de dezembro de 1981, foi confinado junto com outros milhares de militantes do movimento.

Liberado após 11 meses, tornou-se, com o irmão, um colaborador do líder histórico do primeiro sindicato livre do mundo comunista, Lech Walesa, de quem acabou se distanciando nos anos 1990. Kaczynski era casado, tinha uma filha e um neto.

Junto ao irmão gêmeo, o ex-primeiro-ministro polonês Jaroslaw Kaczynski, entrou, no final dos anos 1970, na oposição anticomunista e, em 2001, fundaram juntos o partido Direito e Justiça. Entre julho de 2006 e novembro de 2007, os dois irmãos governaram juntos a Polônia - Lech como presidente e Jaroslaw como chefe de Governo.

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Já um tanto esquecida pela mídia ocidental, em meio a cinzas vulcânicas, colapsos financeiros, brumas russas e mísseis iranianos, a morte do presidente polonês em 10/04, quando da queda do avião [em Smolensk, Rússia] que levava a ele e numerosa comitiva para uma cerimônia em homenagem às vítimas do massacre de Katyn, cometido pelos soviéticos em 1940, no qual cerca de 22.000 poloneses foram sumariamente fuzilados por tropas da NKVD (antecessora da KGB), levantou várias perguntas, quase todas ainda não respondidas. Se depois de duas semanas retomo o assunto é pelo simples fato de que se as repercussões esmorecem na mídia, as consequências dessas mortes se farão sentir ainda por muito tempo, e não só na Polônia.

Acredito que a principal pergunta seja: quem se beneficiou com morte de Lech Kaczynski?

Note: eu pergunto quem se beneficiou e não quem supostamente teria tramado para matá-lo, diferente de alguns “analistas” que já se apressaram em apontar um complô da FSB (sucessora da KGB e da NKVD) como o responsável pela queda do avião. No campo das especulações e até mesmo dentro daquilo que é verossímil e lícito ponderar, ou mais ainda, considerando o histórico das conturbadíssimas relações soviético-polonesas e russo-polonesas, não descarto essa possibilidade, mas devo ressaltar que a verdade completa muito dificilmente será conhecida. Primeiro porque o avião caiu em território russo, quase na cabeceira da pista do aeroporto militar de Smolensk; segundo porque o chefe das investigações é ninguém menos do que Vladimir Putin. Dito isto, mesmo que sejam apresentados indícios concretos de que houve mera falha humana ou outra causa fortuita, sempre será possível duvidar da origem e solidez desses indícios. E se não descarto essa possibilidade, já rotulada de “o mais conveniente acidente da história recente”, não há elementos disponíveis para avançá-la até a uma conclusão definitiva. Sobre as causas, a dúvida será perene, como sempre há dúvida e mistério em quase tudo que envolve a Rússia e seus interesses. Mas que o leitor não se engane: tais interesses são ainda mais nebulosos quando elevados a outro patamar, qual seja, o das relações russas com banqueiros e grandes grupos industriais ocidentais.

Por outro lado, não há nada de especulativo na tentativa de apontar os beneficiários, diretos ou indiretos, da morte de Lech Kaczynski. São eles:

* Donald Tusk, o primeiro-ministro polonês e seu partido, o Plataforma Cívica, cujo candidato à presidência, Bronislaw Komorowski, já antesdo acidente estava um pouco à frente nas pesquisas de intenção de voto. A não ser que Jaroslaw Kaczynski, o ainda mais intransigente irmão gêmeo do presidente morto resolva concorrer, o panorama imediato é de vantagem para o "Plataforma Cívica", descrito como partido de centro-direita, mas amplamente favorável à “normalização” das relações com a Rússia e de uma acomodação bem menos estridente aos ditames da União Européia.

* A Rússia, mais precisamente Vladimir Putin e Medvedev. A despeito da planejada cerimônia conjunta de homenagem às vítimas de Katyn, em anos recentes houve um renovado esforço russo no sentido de lançar dúvidas sobre a culpa soviética, além de manter selados os seus arquivos sobre Katyn. Renovando a velha prática stalinista, o governo russo vinha maquiando os livros de história de forma a apresentar o período soviético em tons mais róseos que o vermelho de muito sangue. Afinal, sob o socialismo, “é impossível prever o passado”. Para dar uma pequena idéia de mais esse episódio de revisionismo, já neste 1º de maio de 2010, a antes banida figura de Joseph Stalin estará novamente estampada por toda Moscou, como lembrança de “um grande líder”.

* A União Européia e mais especialmente a Alemanha, que se viram livres de uma autêntica pedra no sapato na figura de Lech Kaczynski. E por quê? Ele era nacionalista, ferrenho anticomunista, católico fervoroso (e, portanto, antiaborto) e crítico feroz de várias políticas da UE. Como presidente, era chefe de estado, e dele se esperava a postura de figura simbólica e meramente cerimonial, mas sem poderes, estes reservados ao chefe de governo, o primeiro-ministro. Mas ele não se fazia de rogado e falava muito, muito mais do que seus pares gostariam de ouvir em público. Kaczynski denunciou os acordos entre Alemanha e Rússia, que deixaram aquela virtualmente refém do petróleo e gás russos; logo após a invasão russa à ex-república soviética da Geórgia, em agosto de 2008, foi o primeiro líder europeu a protestar e o único a ir pessoalmente à capital, Tbilisi, para prestar apoio ao país invadido, o que instantaneamente o transformou em respeitado porta-voz das pequenas repúblicas do leste europeu, temerosas do renovado expansionismo russo sob Putin.

* Barack Obama, mesmo que indiretamente, pois Lech Kaczynski era pró-americano, pró-Otan, que via no proposto escudo antimísseis uma garantia contra as “imprevisíveis” pretensões russas na região. Dizer que poloneses e tchecos ficaram frustrados diante do recuo e tibieza de Obama é usar de um eufemismo atroz, considerando a história de acordos entre grandes potências e os resultados desses para os infelizes povos da região. Obama agora talvez possa contar também com um novo líder polonês mais “cordato”, enquanto cínica ou ingenuamente assina tratados que só trazem benefícios aos russos.

* Grande porção da esquerda política polonesa, formada em grande medida por “ex-comunistas”. De início, os irmãos Kaczynski foram assessores muito próximos de Lech Walesa, o primeiro presidente polonês pós-comunismo. Os três eram oriundos do Movimento Solidariedade, mas Walesa os demitiu quando eles exigiram ações mais firmes e decisivas para a abertura de arquivos da polícia secreta e na revelação de agentes comunistas. Mais tarde, em 2005, o partido conservador Lei e Justiça, formado pelos irmãos Kaczynski, chegou ao poder com a promessa de construir uma nova “IV República” na Polônia, livre de corrupção e daquilo que eles chamavam de “teia cinza” entre ex-funcionários comunistas e empresários que estavam drenando os recursos da nação. Durante anos, essa denúncias foram ignoradas, mas por volta de 2005, na esteira de grandes escândalos no governo, muitos poloneses passaram a acreditar neles. Fazendo um breve retrospecto, em seu auge o movimento Solidariedade, comandado por Lech Walesa, contava com cerca de três milhões de membros e estima-se que um milhão eram também membros do partido comunista polonês. O próprio Walesa foi acusado de ter sido informante e colaborador direto do regime comunista na Polônia.

(...)

Finalizando, minha interpretação das reações mais imediatas a mais essa tragédia polonesa deve-se à extraordinária colaboração das senhoras Wanda Jeziorowski e Irene Paul Dmyterko, cuja fluência na língua polonesa permitiu-me navegar por três dos mais importantes jornais poloneses, na busca não de notícias propriamente, mas de nuances linguísticas que me trouxessem algum dado novo: o RZECZPOSPOLITA (de centro-direita), a Gazeta Wyborcza (de centro-esquerda) e o tablóide FAKT (curiosamente, de propriedade de um grupo editorial alemão). O resumo, em duas frases de jornalistas distintos, é o retrato dos conflitos vividos entre o “intransigente” Lech Kaczynski e seus adversários: “Será que esta tragédia nos fortalecerá?” e “Adentramos o caminho da reconciliação com os russos”. Em outras palavras, o que está em jogo é, mais uma vez, a sobrevivência de um estado realmente soberano e verdadeiramente cristão e ocidental. O resto são brumas e cinzas.

Fontes (leia na íntegra):

http://www.midiaamais.com.br/eua-e-geopolitica/3016-katyn-ii-a-morte-que-lhes-caiu-bem

http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=276057

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