segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Cristo Pantocrator (παντοκρατωρ)


Esta imagem de Cristo foi feita no século VI e encontra-se no Mosteiro de Santa Catarina de Alexandria, no monte Sinai. Trata-se de uma obra cuja técnica de pintura (encáustica) consiste no uso de pigmentos e de cera tratados a quente. Este procedimento causa um efeito de translucidez imensa na obra. Quando olhamos para as metades separadas do rosto, conseguimos enxergar quase que duas pessoas diferentes. Mas se unimos os dois lados ficamos perturbados com aquela aparente contradição.
Não se trata de esquizofrenia. Jesus não possui dupla personalidade. Jesus é a “imagem do Deus invisível”, a ponto de Ele poder dizer: “Quem vê a mim, vê o Pai”. E é com este amor desafiador e acolhedor que Deus Pai nos ama. Seria heresia escolher e optar apenas por um dos dois olhares. Heresia – hairesis – quer dizer exatamente isto, escolher, preferir apenas Um “pedaço” da verdade. Se olharmos para cada época ou cada pessoa, notaremos uma tentação herética de escolher um destes olhares. Marcião (século II) foi o primeiro a contrapor estas duas formas de amar, criando dois deuses. Para ele, existia um Deus mau, vingativo e irado do Antigo Testamento e um Deus bom, amoroso e misericordioso do Novo Testamento. Deveríamos escolher o segundo e abandonar o primeiro.
A Igreja lutou contra esta heresia desde cedo, compreendendo o desequilíbrio teológico e espiritual que se encontrava por trás daquela aparente coerência racional.
O católico é sempre assim. Ele vê duas verdades de fé, aparentemente contraditórias. Não escolhe nenhuma das duas, acolhe as duas e procura resolver aquela contradição com uma teologia. Mas o coração católico sabe que seu esforço teológico é sempre limitado e humano. O importante é abraçar a fé completa (kat’holikos – completo, conforme o todo).
Espero ter sido católico neste livro e ter apresentado o todo destes dois olhares. Não fujamos do olhar de Deus e, em todas as páginas deste livro, tenhamos presente a oração de Santo Agostinho:
[Senhor], ninguém vos perde, a não ser quem vos abandona.
E porque abandona, para onde vai ou para onde foge senão para
longe de ti misericordioso e para perto de ti irado?
(Te nemo amittit, nisi qui dimittit, et quia dimittit, quo it aut quo fugit nisi a te placido ad te iratum?, Santo Agostinho, Confissões, 4, 9, 14)
Texto Extraído do Livro "Um Olhar que Cura" de Pe. Paulo Ricardo

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